Chocolate quente

Ela sentou no balcão, pediu um chocolate quente, sabia que viria com um merengue açucarado. Tentava segurar as lágrimas.

Iria sorver as colheradas, adoçar a alma, já que a tristeza que invadia o seu peito doía como ferro queimando.

As atendentes conversavam e riam, ignorando aqueles sentimentos.

Quando a caneca chegou, a moça percebeu que as lágrimas escorrendo, sem cerimônia, se afastou, chegou perto da colega e deu uma cotovelada, apontando com a cabeça.

Se instalou o silêncio!

Saberia depois que faltava apenas uma hora para a morte, mas pressentia.

Estava deixando para trás o último abraço que dera no irmão, não voltaria a vê-lo vivo.

O corredor do hospital trazia para cafeteria os barulhos metálicos das macas e cadeiras de rodas, das portas que batiam. Havia o forte cheiro do álcool misturado ao desinfetante. Era melhor ouvir as pessoas da cafeteria.

O chocolate ajudava pouco, haviam gritos internos, que teimavam em sair expressados pela água que escorria pelo rosto.

Quem vende doce nos hospitais deve entender de dores.

Há um quê de curiosidade na relação do açúcar com a tristeza. Por instinto pedira um chocolate quente, segunda vez que tentava aplacar uma dor de morte, aprendera isso no velório do pai, alguém havia colocado uma bala na sua boca.

No prédio do hospital, antigo e velho, transitava há dias. A lanchonete, escura e sombria, cumpria a função de alimentar as suas mazelas.

Eram dias tristes, dias de despedida de um amor fraterno.

Nunca mais o chocolate quente teria aquele sabor agridoce. Provavelmente, seria o último.

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Querido diário – arrependimento

Querido diário eu me pergunto quantos eleitores do Bolsonaro estão arrependidos de terem votado nele?

Sei que vários professores votaram, mesmo sem nunca terem visto uma mamadeira de piroca numa creche, uma aula de abuso sexual em suas escolas e nem tão pouco a doutrinação marxista, de que falam… Me pergunto como esses profissionais estão reagindo a retirada dos cursos de filosofia e sociologia do ensino superior, se concordam com as mudanças na educação, com o novo ministro e com as propostas estapafúrdias, com o corte de verbas para as bolsas de pesquisa?

Também sei que alguns amigos, que defendem um mundo com atenção a natureza, a sustentabilidade e a preservação das áreas de Proteção ambiental também votaram neste candidato. Aí me ocorre a mesma indagação, satisfeitos com o desmonte do CMBIO, do IBAMA, com o descaso com o meio ambiente, com a perda de grande parte da equipe técnica demitida, com mais de 20 anos de experiência na área? E a proteção da natureza e das águas, com os mais de 400 agrotóxicos aprovados? O desmatamento da Amazônia, a invasão pelos grileiros e pelas mineradoras das terras indígenas preservadas? Como eles estão se sentindo com isso?

E as pessoas da saúde? Milhares de brasileiros sem atendimento médico, principalmente no interior do país, porque os médicos cubanos foram mandados embora e os brasileiros só assumiram em lugares convenientes. Hoje os hospitais estão cada dia mais lotados, porque as unidades de saúde foram fechadas ou estão sucateadas. Como estão sentindo?! Sei de uma médica, porque ela me disse, com mais de 20 anos de profissão, que a é primeira vez que tem vontade de se demitir do hospital público, porque ela gostaria de estar atendendo os casos graves, da área dela, AVC, infarto do miocárdio, mas está atendendo gripes, resfriados, infecções de garganta, porque a população não tem mais posto de saúde… O atendimento básico à saúde acabou!

Segurança pública, estão gostando? A única coisa que eu tenho visto é a morte de pessoas sem qualquer ligação com o crime, de trabalhadores, não estou vendo nenhum combate ao crime organizado e as milícias. As taxas de feminicídio aumentaram drasticamente. As mulheres se sentem mais seguras com a liberação do porte de arma?! Passou a sensação de que é possível ser estuprada a qualquer momento?!

Quem votou nele está gostando da reforma da previdência? Ou vai ser atingido por essa reforma em cheio?! A reforma que não mexe com privilégios de bancos, que aumenta o soldo dos militares significamente (em alguns casos em até 73%), que não mexe com grandes fortunas. O cidadão comum tem que pagar impostos, o de renda e todas as taxas impostas pelo governo, como IPVA e o IPTU. E para as grandes empresas o governo é um pai cheio de bondades, tem parcelado seus devidos impostos, inúmeras vezes, com imensos descontos, sem necessidade alguma, tem até um cidadão que conseguiu parcelar em 104 anos.

Os ricos não pagam taxas pelo seus aviõezinhos, nem pelo seu jet-ski, pelo seu iate, podem voar e navegar livremente, sem taxa nenhuma, sem imposto nenhum por esses bens de nenhuma necessidade, você está sentindo representado?

Não questiono nenhuma pessoa da área da economia liberal, essas votaram conscientes com o que pensam, com o desmonte do estado, na desestatização, de acordo com o pensamento liberal. Votaram por este motivo, são extremamente coerentes com seu voto, até tinham outros candidatos para votar: o Alckmin, o João Amoedo, o Meirelles, até mesmo o Ciro Gomes, que já foi ministro da fazenda. Temos aqui um fato concreto, não quiseram arriscar, preferiram votar num inepto e inapto, apostando em Paulo Guedes.

E os filhos querido diário, o que é isso?!

Querido diário tem sido difícil assistir a tudo isso, como já falei antes, mas eu sabia que tudo isso iria acontecer e por isso repudiei desde o início este candidato. Eu não tenho nenhum arrependimento do meu voto.

querido diário como viver nesse país onde as pessoas deixaram de se importar e agora o que realmente importa?! É só o dinheiro, o capital, o dólar, a bolsa? Qual o cidadão comum que aplica o seus parcos recursos nesses lugares ?! Aliás, aplicar o quê?! Muitos deles estão desempregados e nem se sustentar e a sua família conseguem…

Trocaram o ser pelo ter! Só que quem vai ter não é o povo brasileiro, é aquele que sempre teve e cada vez terá mais!

2017 o ano que continuou em 2018

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Gente do céu, pensem num ano difícil!

No trabalho o ano começou conturbado, joga a gente pra lá, volta pra cá, fica-se no aguardo de melhorias e nada…

Em abril começa um febrão, nos primeiros 10 dias, diagnóstico, virose, o médico mesmo diz, quando não se sabe o que é dizemos ser virose, isso na segunda.

Na madrugada de quarta para a quinta-feira os dois ouvidos estouram, vai para o pronto-socorro, começa o antibiótico. Oito dias depois um formigamento estranho na boca, parecia que a xícara não encaixava direito, vai no PS de novo, no atendimento pedi um otorrino, caí em excelentes mãos.

O médico fala, é grave vou te internar! Oi… O que?! Já ouviram falar em otomastoidite com paralisia facial (essa eu conhecia), nem eu … Me mandou imediatamente para o PS começar a medicação enquanto aguardava uma tomografia cerebral, que confirmou o diagnóstico, 10 dias de hospitalização, uma cirurgia para drenar a infecção e o rosto completamente torto.

Durante os dias de hospitalização meus diretores foram demitidos, eu sabia que também seria, segundo escalão imediato.

Saio do hospital descompensada, o médico já havia me avisado, vou te curar disso, mas, em compensação, teu corpo será todo desregulado, falou e disse, preciso que  especialistas te acompanhem! Açúcar alto, pressão desequilibrada, nervos da face paralisados. Segue tratamento em casa, muita fisioterapia, visita a neurologista, cardiologista, endocrinologista, fonoaudióloga, fisioterapeuta neurológico, acupunturista, tinha uma agenda de saúde plena.

Assim que os antibióticos e corticóides terminaram já em meados de maio sinto no ombro dores agudas que me impediam inclusive de dormir, vamos para o ortopedista?! Vamos!

Exames feitos rupturas de tendão e ligamentos, quase totais. Resultado,  o médico anuncia cirurgia em agosto e 2 meses de imobilização e a fisioterapia que ainda tem que completar.

Junho, finalmente férias e uma viagem planejada, desde dezembro do ano anterior, com minhas amigas, para Portugal e Espanha. Último dia no exterior chega a mensagem da minha exoneração naquela semana, já previsível. Mas cada dia da viagem compensou o que aconteceu antes e deu energias para o depois.

Julho um monte de anti inflamatório e remédios para dor para aguentar até a cirurgia em agosto.

Setembro imobilização e fisioterapia em casa.

Outubro o hospital Sarah me liga para fazer a cirurgia de vértebra deslocada, esqueci de falar, foi diagnosticada em janeiro, foi postergado devido ao tratamento de ombro e ainda estou analisando.

Tanta tensão e veio a consequência, uma convulsão, que agora está sob controle com mais medicação.

Novembro, vamos visitar minha mãe em Pelotas, tudo ótimo com passeios, já no avião vem a notícia, ela havia sido hospitalizada, bate volta Brasília/ Pelotas. No regresso, na saída do hospital, tendo em vista os cuidados necessários, levo minha mãe para uma casa geriátrica, acho que gastei minhas lágrimas nesse episódio.

No retorno a Brasília sigo direto para o hospital, infecção das vias aéreas superiores, bronquite e sinusite, mais medicação.

Passou dezembro e eu estou aqui pensando em tudo de bom que tive em 2017: meu marido o tempo todo ao meu lado, me dando o amor e o apoio que necessitei; filhos (aqui nestas palavras estão nora e genro) se revezando em cuidados comigo e me fazendo sentir o quanto sou amada; minha neta mais velha me acompanhando no hospital e se fazendo presente sempre que precisei; minhas amigas se alternando para me cuidar e me divertir;  meus pequenos netos enviando mensagens de apoio no WhatsApp, pedindo para a vovó melhorar logo; uma viagem incrível para recuperar a alma e dar as forças para prosseguir; amigos de longa data e longa distância enviando mensagens de força e energia; parentes próximos segurando a onda quando eu não conseguia; minha mãe me abraçando no dia em que me despedi dela e me dizendo que me ama! Criei o blog e a Página Pós50 e o grupo de mulheres Conversando o Pré e o Pós50, pensem numa criatividade a mil!

Por mais que 2017 e 2018 também esteja sendo difícil, estamos quase em setembro e este ano também foi de médicos, exames e fisioterapia e novos diagnósticos, mas ainda consigo reconhecer o lado bom em tudo e só posso dizer – minha gente obrigada por todo o apoio!

Dou notícias…