A casa em que nasci

seus jardins, cheiros e cores…

Lembro da casa em que nasci e de toda a magia que ela sempre despertou em mim, com seus cheiros e cores.

A casa em si era cinza, de cimento penteado, com janelas verdes escuras. Tinha um lindo jardim e um pátio, de sonhos e magias, aquelas que as mentes das crianças, ainda intocadas pelo mundo, tem.

Na frente havia uma escada de mármore branco, margeado por outro azul, lindo, para mim, bancos, reconfortantes depois de correr em volta da casa e passear entre árvores e plantas.

O muro tinha desenhos e recortes, era uma montanha russa para os meus pés. Caminhar sobre ele era uma aventura, cheia de desafios, quanto mais rápido melhor e, na mente infantil, extremamente perigoso.

O jardim tinha flores aromáticas, borboletas, joaninhas, de diferentes cores, tamanhos. Na frente, bem no centro, as amarelas fortes, quase um laranja, cabos bem fininhos e altos que desafiavam a gravidade, depois as papoulas vermelhas, de pétalas tão finas e sedosas, me lembravam asas de borboletas.

A grama era entrecortada por pedras de granito. Os quadrados irregulares, faziam os caminhos a serem percorridos.

De um lado sempre bateu mais sol, porque a casa ficava mais para a direita do terreno, não foi centralizada propositadamente, para se fazer a estradinha de granito cortado até o final, onde ficava a garagem.

No muro alto que ladeava havia um roseiral. Rosas grandes, rosa claro, saiam de troncos retorcidos, ali tinham uma convivência harmoniosa com as orquídeas, em sua maioria chuva de ouro e com a hera que recobria o cimento, deixando o cinza verde.

Do outro lado, na parede mais solar, havia um canteiro cavado no solo, cujas laterais possuíam pequenas corredeiras de cimento, que escoavam as chuvas no terreno inclinado, o meu pequeno rio, onde foram depositados muitos barquinhos de papel.

Flores diversas, de muitas cores, tamanhos e variedades faziam a minha festa, margaridas, bocas -de-leão, onze horas, hortênsias. Lembro de uma, especialmente, cuja a seiva depositada nas pétalas era de uma doçura ímpar, intercalava o sabor com as azedinhas. Muito mais tarde alguém me falou que era tóxica, mas não me fez mal algum…

Ao fundo espadas de São Jorge e de Santa Bárbara ornavam as multicoloridas flores.

No pátio, ao fundo, eu tinha a minha floresta particular, formada por abacateiros, limoeiros, árvores de uva japonesa, pitangueira, bergamoteiras, nêsperas doces, árvore onde eu subia para ver a floresta de cima, todas frutíferas e podia ver a parreira de uvas, onde fazia o meu piquenique imaginário.

Do outro lado,  que deveria ser o sombrio, moravam as hortênsias, azuis, rosas e brancas, sentia ao passar o perfume que vinha do solo, cheiro de umidade e terra preta, profundo, ainda consigo lembrar de cada um dos aromas desse jardim, ficaram impregnados na minha memória.

Havia uma escada de cimento nos fundos, alta, mais inclinada que a da frente, e outra igual entre as hortênsias.  Subir e descer era uma aventura. Mais ainda a das hortênsias cuja porta estava sempre fechada por segurança, mas para mim isso tinha todo um mistério.

Embaixo de cada escada havia uma porta, elas levavam às imaginárias cavernas. A da frente só era aberta vez em quando, para guardar as ferramentas do jardim, soube muito tempo mais tarde. A de trás levava ao tanque e a sala de lenha, usada diariamente para o fogão, para a lareira, no inverno, e a salamandra de ferro, do quarto de meus pais.

Na lateral, uma porta levava ao porão, para um salão onde minha tia dava aulas de francês, onde eu moraria após a morte do meu pai. Aquele lado tinha o cheiro de terra molhada na primeira chuva.

Vivi muitas aventuras em meu jardim, criei muitas outras imaginárias, a cada estação ele mudava, sempre havia uma flor brotando, frutas amadurecendo, cheiros novos no ar.

Talvez ele nem fosse tão grande, como eu imaginava, mas era grandioso, efervescente, vibrante e possibilitou que o meu imaginário infantil viajasse por mundos desconhecidos, me deu asas, sonhos, viagens mil.

Meus jardins foram refúgio da alma, as flores sempre me comovem, os gramados ampliam os meus horizontes.

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Hemerocallis – o lírio de um dia

Hoje eu assisti o filme A Mula com Clinton Eastwood, baseado em fatos reais. Recomendo!

Um aspecto especial tomou a minha atenção, o início do filme, que apresenta o principal personagem, Earl, como cultivador das Hemerocallis, a flor da foto.

Na minha família havia duas pessoas apaixonadas por plantas, minha avó e o seu genro, meu pai.

Esse amor atravessou a geração e me tocou. Flores sempre me encantaram. As do meu pai, mais ainda. Era apaixonado por elas e me transmitiu esse sentimento. Os jardins desenhados por ele eram lindos.

Na casa da cidade, na minha infância, tínhamos flores multicoloridas. Eu passava horas e horas naquele jardim, olhando as hortênsias brancas, azuis e rosas as papoulas vermelhas, as bocas de leão multicoloridas. Os muros eram recobertos por hera, e troncos de rosas trepadeiras, onde orquídeas chuva de ouro repousavam.

Os jardins da casa da praia eram os meus preferidos, as flores eram mais rasteiras, mais ao meu alcance. Meu pai dedicava boa parte do tempo àquele jardim.

Ali tínhamos muitas rosas, muitas mesmo, de todas as cores e multicoloridas, copos de leite, Pallas, Strelitzia reginae, Margaridas, Amor Perfeito, Amarílis, lírio japonês, cravo, dálias, onze horas, zinias, pessegueiro de jardim, gladilos, astromelias, Iris e Narcisos.

O lírio de um dia, os do filme, me fizeram viajar para minha infância. Eles rodeavam os muros baixos do enorme terreno da casa, eu tinha fascínio por eles, ficava horas passando a mão nas plantas, abrindo o invólucro das sementes, de bolinhas pretas, enquanto percorria a linha do muro. Cada flor, originária de um bulbo, durava apenas um dia.

Uma imagem, uma flor e uma infância inteira para recordar.

A magia dos nossos jardins

Lembro da casa em que nasci e de toda a magia que ela sempre incutiu em mim com seus cheiros e cores.

A casa em si era cinza, de cimento penteado, com janelas verdes escuras, tinha um lindo jardim e um pátio de sonhos, cheio de magias, aquelas que as mentes das crianças, ainda intocadas pelo mundo, tem.

Na frente havia uma escada de mármore branco, margeado por outro azul, lindo. Para mim os degraus eram bancos, reconfortantes depois de correr em volta da casa.

O muro tinha desenhos e recortes, era a montanha russa dos meus pés, caminhar sobre ele era uma aventura, cheia de desafios, quanto mais rápido melhor.

O jardim tinha flores de diferentes cores e aromas, na frente, bem no centro, as amarelas fortes, quase um laranja, cabos bem fininhos e altos que desafiavam a gravidade, depois as papoulas vermelhas, de pétalas tão finas e sedosas, me lembravam asas de borboletas.

A grama era entrecortada por pedras de granito. Os quadrados irregulares, faziam os caminhos a serem percorridos.

De um lado sempre bateu mais sol, porque a casa ficava mais para a direita do terreno, não foi centralizada propositadamente, para se fazer a estradinha de granito cortado até o final, onde ficava a garagem.

No muro alto que ladeava havia um roseiral, rosas grandes, rosa claro, saiam de troncos retorcidos, ali tinham uma convivência harmoniosa com as orquídeas, em sua maioria chuva de ouro e  com a hera que recobria o cimento, deixando o cinza verde.

Do outro lado, na parede mais solar, havia um canteiro cavado no solo, cujas laterais possuíam pequenas corredeiras de cimento, que escoavam as chuvas no terreno inclinado, o meu pequeno rio, onde foram depositados muitos barquinhos de papel.

Flores diversas, de muitas cores, tamanhos e variedades faziam a minha festa, margaridas, bocas -de-leão, onze horas. Lembro de uma, especialmente, cuja a seiva depositada nas pétalas era de uma doçura ímpar, intercalava o sabor com as azedinhas. Muito mais tarde alguém me falou que era tóxica, não me fez mal algum…

Ao fundo espadas de São Jorge e de Santa Bárbara ornavam as multicoloridas flores.

Do outro lado,  que deveria ser o sombrio, moravam as hortênsias, azuis, rosas e brancas, sentia ao passar o perfume que vinha do solo, cheiro de umidade e terra preta, profundo, ainda consigo lembrar de cada um dos aromas desse jardim, ficaram impregnados na minha memória.

No pátio, ao fundo, eu tinha a minha floresta particular, formada por abacateiros, limoeiros, árvores de uva japonesa, pitangueira, bergamoteiras, nêspera doces, árvore onde eu subia para ver a floresta de cima, todas frutíferas e podia ver a parreira de uvas, onde fazia o piquenique imaginário.

Havia uma escada de cimento nos fundos, alta, mais inclinada que a da frente, e outra igual entre as hortênsias.  Subir e descer era uma aventura. Mais ainda a das hortênsias cuja porta estava sempre fechada por segurança, mas para mim isso tinha todo um mistério.

Embaixo de cada escada havia uma porta que levavam às cavernas, isso no meu imaginário infantil. A da frente só era aberta vez em quando, para guardar as ferramentas do jardim, soube muito tempo mais tarde. A de trás levava ao tanque e a sala de lenha, tanto para a lareira no inverno, quanto para o fogão de ferro da cozinha.

Na  lateral a porta levava para um salão onde minha tia dava aulas de francês,  o porão, onde eu moraria após a morte do meu pai.

Vivi muitas aventuras em meu jardim, criei muitas outras imaginárias, a cada estação ele mudava, sempre havia flor brotando, frutas amadurecendo, cheiros novos no ar. Talvez ele nem fosse tão grande como eu imaginava, mas era grandioso, efervescente, vibrante e possibilitou que o meu imaginário infantil viajasse por mundos desconhecidos, me deu asas, sonhos, viagens mil.

Até hoje consigo me refugiar nele, quando preciso de calma e concentração é para lá que viajo. Essas lembranças sempre me conectam contigo, também tinhas um jardim cheio de flores, um pátio cheio de aventuras, que rica vida foi ali vivida. Quantos sonhos não podes mais viver…

Texto dedicado a Cláudia Pinho Hartleben, amiga desaparecida.